Ronaldo da Silva, servidor do TRT/BH
Os artigos aqui publicados são de inteira responsabilidade do autor, não sendo esta necessariamente a opinião da diretoria do SITRAEMG.
Mas também sabemos das dificuldades, das resistências enfrentadas pelos colegas. Além disso, temos ciência da possibilidade de constrangimento nas relações socioprofissionais no retorno ao trabalho.
A individualidade e a pessoalidade ainda são características muito presentes no serviço público, resquícios de uma tradição de privilégios pessoais, de patrimonialismo, de prevalência do interesse individual sobre o coletivo.
Entendo que a decisão sobre a greve é individual, respeito a opinião dos que não aderem, mas é preciso também que se conscientizem do seu caráter coletivo.
Como a colega Patrícia disse, a greve traz benefícios para todos, apesar de alguns não lutarem.
A greve é um movimento de grupo, de categoria, e não existiria se apenas um ou outro a ela aderisse.
A greve é de todos. Tanto dos que pararam quanto dos que sustentam os colegas, greve por meio de revezamento para garantia da prestação dos serviços essenciais.
É o apoio mútuo, decidido em reunião com colegas da unidade, que sustenta um movimento desses.
Ademais, é uma decisão da categoria em assembleia geral que deve ser ao menos respeitada pelos que não aderem.
Será sim estressante para todos nós voltar ao trabalho e ter que conviver não com aquele que não aderiu, cuja decisão individual respeitamos apesar de não concordamos com ela, mas sim com aquele que não nos apoiou, que nos ameaçou, que nos pressionou.
O momento de crise, que também uma greve dessa provoca – com nervos à flor da pele, cansaço físico e mental, baixa de resistência e sensibilidade aumentada – é “o” momento de conhecimento do outro.
A verdade revela – se mais na crise do que na tranquilidade, apesar de gostarmos muito da tranquilidade, que realmente deve ser a sensação na qual devemos pautar nossas vidas.
Mas as crises, os picos de paixão, são essenciais para o autoconhecimento, para o conhecimento do outro e para nos mostrar a direção da mudança.
Essa greve é mais do que um movimento por melhores salários.
Essa greve é um movimento de mudança, mudança de atitude (saímos da inércia para a dinâmica, para a ação por nós mesmos promovida), mudança de cultura institucional (da preferência pelo interesse individual para a supremacia do interesse coletivo).
São esses momentos de pico – de paixão por uma causa, por uma pessoa, pelo trabalho – que constroem a nossa história.
São eles que nos dão a força vital para abraçar o novo que se nos apresenta, a princípio estranho e perigoso, mas que nos rejuvenescem e transformam nossas vidas para sempre.
Não!
Eu não quero ser esse funcionário público, estatutário, de pesados arquivos imóveis, de carimbos batidos repetida e cotidianamente, de papéis de ofícios ao ilustríssimo senhor diretor, de congratulações, às vezes hipócritas, de elevada estima e consideração, do temor reverencial, da posição estática na cadeira, atrás da mesa, olhar fixo para a tela de um computador…
Não!
Eu sou um prestador de serviços ao público, àquele público que confia em meu trabalho de garantir-lhe um tratamento adequado na solução de sua questão em face da Justiça. Por isso, eu também desejo e exijo um tratamento adequado pelo Poder Público.
Eu sou um servidor que deseja mudanças constantes, que quer a boa nova no Serviço Público, que detesta o corporativismo, o patrimonialismo em todas as suas manifestações, o individualismo exacerbado e incoerente, o privilégio pessoal.
Sou uma pessoa idealista, portanto, apaixonada, como são essas pessoas sonhadoras. Mas tenho meus pés na terra. A minha paixão é a paixão diante do possível, muito embora, às vezes, penso ser plausível exigir o impossível.
A minha paixão não é a paixão platônica, a paixão da espera, mas sim a paixão proativa.
Assim, sou um servidor que luta pela democratização das decisões institucionais, pela qualidade de vida no trabalho, pela “horizontalizaçao” do poder, por uma nova maneira de tratar questões advindas das relações socioprofissionais, enfim, pela mudança da cultura no nosso serviço público.
E essa mudança requer alguns sacrifícios, principalmente o sacrifício de optar pela coletividade, pela supremacia do interesse público em face do interesse individual.
Como nosso colega Carlos Ovo sempre falou: eu não gosto de greve, eu gosto é de trabalhar! Trabalhar não exige tantos sacrifícios quanto uma greve dessa dimensão de nós exige.
Mas trabalhar, não obstante estarmos fazendo o que gostamos, é o ato cotidiano, a repetição continuada no tempo, o “mais do mesmo”, o “funcionário público estatutário”.
A greve é o pico, a paixão que rege as mudanças, a atitude diante da inércia, o ato histórico!
E é esse ato histórico, esse pico que provoca a mudança – e não a repetição cotidiana – que será parte da biografia que estamos escrevendo.
Parabéns aos servidores que optaram por se apaixonar e escrever sua história!
Abraço forte!